A força do movimento associativo existente em Vila Nova de Gaia, desde logo no plano cultural, desportivo e social, mas também organizando outras formas de intervenção cívica, é uma riqueza incalculável do nosso concelho, que em muito contribui para a valorização da cidadania e para o fortalecimento do tecido social. É um tesouro, raro, do qual importa cuidar. E isso significa apoiar as instituições, mas não de qualquer forma.
Em primeiro lugar, é preciso que um qualquer apoio dado a uma colectividade deixe de ser um acto discricionário de exercício de poder, deixe de ser uma arbitrariedade, e passe antes a ser a consequência natural de regulamentos claros e mecanismos transparentes que importa criar. Isso é o mais importante. Para termos a garantia de financiar projectos capazes, com provas dadas ou com bom potencial. Para termos, tanto quanto possível, garantia de boa gestão dos apoios concedidos. Depois, é também necessário promover a autonomia de gestão das várias associações – por exemplo, dando formação aos seus dirigentes. Valorizar as diferenças no seio do movimento associativo, promovendo intercâmbios entre associações. Aproveitar ao máximo o potencial do movimento associativo, reforçando as ligações com o sistema escolar. Estes são alguns dos critérios pelos quais, no entender do Bloco de Esquerda, a Câmara se deveria pautar no relacionamento com o movimento associativo.
É claro que, num momento de crise, no qual diminuem as receitas do município, há que fazer escolhas, como justamente argumenta a Câmara. Mas a verdade é que o associativismo é um alvo fácil demais, que a Câmara privilegia em vez de procurar reduzir outras despesas. E com essa escolha, a nosso ver injusta, a Câmara opta por desvalorizar o tesouro que é o movimento associativo gaiense, em vez de o estimar.
Mas falemos de Desporto.
A retirada de apoios está já a causar dificuldades a vários clubes. Por exemplo, o GD do Marco, com tradição e pergaminhos na modalidade de ténis de mesa, encontra-se hoje em grandes dificuldades para poder prosseguir a sua actividade.
Ao contrário do que a Câmara reivindica, a prioridade nem sempre parece ser o apoio à formação desportiva, mas sim a orientação para projectos potencialmente capazes de alcançar maior visibilidade.
Senão, vejamos o caso do Estádio Jorge Sampaio, em Pedroso. Trata-se de uma infraestrutura excelente, mas que se encontra subaproveitada e que, se não for possível aumentar significativamente a sua ocupação, corre o risco de se tornar rapidamente num grande elefante branco, se é que não o é já.
Impossível também não referir o que se passa com o Centro de Estágio do Olival, gerido pela Fundação PortoGaia e utilizado (quase em exclusivo) pela equipa profissional de futebol do Futebol Clube do Porto. Ao ser criada para gerir o “Centro de Treino e Formação Desportiva de Olival-Crestuma”, a chamada “Fundação PortoGaia para o Desenvolvimento do Desporto” anunciava ter como objectivos “promover, patrocinar e realizar actividades de fomento desportivo junto da população do concelho de Vila Nova de Gaia” e ainda promover o “desenvolvimento desportivo, com especial incidência para a formação desportiva da população escolar, dos mais jovens e dos estratos socialmente mais carenciados do concelho”. Nada disto sucedeu. Na prática, este Centro de Estágio apenas permite a prática de futebol e é utilizado quase só (em mais de 90%, segundo a última informação conhecida) pela equipa profissional do Futebol Clube do Porto. Mas é pago pelos gaienses: em 2009, segundo revela a Conta de Gerência do Município, a Câmara transferiu para a Fundação PortoGaia mais de 1 milhão e 686 mil euros; e para 2010, estava previsto (nas GOP) transferir mais quase 1 milhão e 495 mil euros. Soma, em apenas dois anos, mais de 3 milhões e 181 mil euros. Seria bom que a Câmara informasse, hoje, quanto já pagou para o Centro de Estágio do Olival, desde o seu início, e que explicasse porque razão todos estes milhões de euros são pagos pelos gaienses para financiar a actividade de uma equipa profssional de alto rendimento desportivo, representativa de um clube cujo orçamento milionário é sem dúvida várias vezes maior do que o da Gaianima! Porque razão, senhor presidente de Câmara? Porque razão, senhores Vereadores?
Mas não falemos só de futebol. Falemos de basquetebol, modalidade com uma popularidade crescente entre os jovens e em expansão também em Gaia. Existem, em Vila Nova de Gaia, quatro clubes: o GD Bolacesto, o Paroquial de Oliveira do Douro, o FC Gaia e o SC Coimbrões. Todos eles apostam na formação desportiva dos jovens. Três destes quatro clubes, nomeadamente o Bolacesto, o Paroquial e o FC Gaia, utilizam regularmente o Pavilhão Municipal que se situa junto à entrada do Parque da Lavandeira. Além do basquetebol, este pavilhão permite também a prática de futebol de salão, sendo ainda utilizado em competições do INATEL e por outros grupos. Pois bem: este pavilhão irá, tudo indica que dentro em breve, fechar, para sofrer obras profundas após as quais reabrirá como um centro de estágio de alto rendimento, para ser utilizado por atletas de alta competição e de outras modalidades. Pergunta-se: que política é esta que permite fechar uma infraestrutura dedicada à formação desportiva e ao fomento da prática desportiva pela população, para a substituir por um centro de alto rendimento, sem sequer cuidar de criar uma alternativa para as centenas de praticantes, de todas as idades, que actualmente utilizam, ainda, o antigo Pavilhão Municipal? É necessário que a Câmara diga, claramente, qual é a alternativa que prevê disponibilizar para cada um dos grupos que vêm ainda utilizando o actual Pavilhão Municipal.
Se a Câmara quer criar, em Gaia, espaços de apoio a atletas de alto rendimento, não o pode fazer à custa dos espaços que vinham sendo utilizados para a formação e o fomento da prática desportiva! Este é, para o Bloco de Esquerda, um princípio fundamental.
Mas peguemos ainda no exemplo do Bolacesto, evidentemente que com todo o respeito pelo trabalho igualmente válido (sublinho: igualmente válido) realizado pelos restantes clubes, mas sem esquecer que o GD Bolacesto é actualmente o único clube gaiense de basquetebol que mantém quer equipas masculinas, quer femininas e que este clube movimenta mais de 200 atletas, de todas as idades, sendo o maior clube de basquetebol do distrito do Porto no que se refere ao número de atletas nos escalões de formação. Pois este clube com 30 anos de história não dispõe de instalações próprias. Dois dos espaços que ocupa, vão brevemente entrar em obras (além do Pavilhão Municipal, também o pavilhõ da escola Secundária Almeida Garrett) e o clube não tem ainda alternativas (como também não a têm os restantes clubes afectados). Recentemente, a Gaianima passou a cobrar aluguer pela utilização dos pavilhões municipais! Para um clube da dimensão do Bolacesto, isto pode significar um custo próximo dos 5 mil euros por ano. Para a generalidade dos clubes de Gaia, é muito! É demais!
Em resumo: a Câmara vai eliminar um espaço de apoio à formação desportiva e ao fomento da prática despotiva, trocando-o por uma infraestrutura de apoio à alta competição e sem criar alternativas; a Câmara passou recentemente a cobrar custos que não cobrava antes, pela cedência dos pavilhões municipais; a Câmara, com frequência, faz-se cobrar pela cedência de transporte, quando este lhe é solicitado por algum clube para fazer deslocar as suas equipas até outros locais do distrito; e alguns clubes já estão a sofrer os efeitos da retirada dos escassos apoios que a Câmara lhes vinha facultando. É isto uma política de apoio à formação desportiva? Não é, lamentavelmente.
Não basta anunciar uma futura Carta Desportiva do município. É preciso uma política de apoio à formação desportiva e ao fomento da prática desportiva que não se confunda com projectos megalómanos nem com o financiamento de actividades profissionais de alta competição ou de alto rendimento desportivo.
pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda,
Vila Nova de Gaia, 22 de Setembro de 2010